Nos últimos 30 anos, o Brasil perdeu cerca de 94% da sua população de jumentos, segundo levantamento da FAO, IBGE e Agrostat, analisado pela organização The Donkey Sanctuary. Em 1999, havia 1,37 milhão de jumentos no país. Hoje, esse número caiu drasticamente para 78 mil, o que representa apenas 6 animais para cada 100 que existiam há três décadas.

Boa parte dessa redução está diretamente ligada à indústria asiática do ejiao, suplemento produzido a partir do colágeno da pele dos jumentos, popular especialmente na China. Comercializado com promessas de melhorar a vitalidade e a saúde, o produto impulsiona um mercado internacional que tem o Brasil como um dos elos de fornecimento.

De acordo com dados do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), mais de 248 mil jumentos foram abatidos entre 2018 e 2024. A maioria dos abates ocorreu no estado da Bahia, que concentra os únicos três frigoríficos do país autorizados pelo Serviço de Inspeção Federal (SIF) para esse tipo de atividade.

“O jumento nordestino possui um perfil genético único, adaptado ao semiárido brasileiro. Sua extinção seria uma perda irreparável para nossa biodiversidade e para as comunidades rurais que dependem dele”, afirma Patricia Tatemoto, coordenadora da campanha da The Donkey Sanctuary no Brasil e pós-doutora em Medicina Veterinária pela USP.

Caminhos sustentáveis e alternativas tecnológicas

Para especialistas, a justificativa de que os jumentos deixaram de ser usados no trabalho agrícola não sustenta a política de abate. Pelo contrário, eles defendem soluções sustentáveis para preservar a espécie:

  • Viverem livres na natureza;
  • Seguir apoiando a agricultura familiar;
  • Serem reconhecidos como animais de companhia.

Além disso, o avanço científico já permite a produção de colágeno por fermentação de precisão em laboratório, dispensando o uso de animais.

“É uma oportunidade para o Brasil liderar um modelo mais sustentável e ético”, avalia Roberto Arruda, agrônomo e doutor em Economia Aplicada pela USP.

Projetos de Lei e mobilização

Diante da crise, dois Projetos de Lei buscam proibir o abate de jumentos no Brasil:

  • PL nº 2.387/2022, em tramitação no Congresso Nacional, já aprovado na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara;
  • PL nº 24.465/2022, em trâmite na Assembleia Legislativa da Bahia, também aprovado na CCJ.

A luta brasileira se soma à mobilização internacional. Em 2023, a União Africana aprovou uma moratória ao abate de jumentos para exportação, medida já adotada por países como Quênia, Nigéria e Tanzânia.

“Não podemos continuar sendo o elo frágil de uma cadeia internacional que lucra com a morte de um animal essencial para comunidades vulneráveis”, alerta Pierre Barnabé Escodro, professor da Universidade Federal de Alagoas (UFAL).

Seminário internacional e campanha global

Com o objetivo de discutir os rumos da preservação dos jumentos no Brasil, entre os dias 26 e 28 de junho, aconteceu em Maceió (AL) a terceira edição do seminário internacional “Jumentos do Brasil: Futuro Sustentável”, promovido pela UFAL em parceria com a The Donkey Sanctuary.

Durante o evento, foi lançado o relatório internacional “Stolen Donkeys, Stolen Futures” e a campanha Stop The Slaughter (“Parem o Abate”), que busca ampliar a conscientização e pressionar por mudanças legislativas e éticas.

A sobrevivência dos jumentos brasileiros depende de ações urgentes. Preservá-los não é apenas uma questão de proteção animal, mas também de justiça social, sustentabilidade e respeito à biodiversidade nacional.

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